Quanto tempo dura a lavagem cerebral?
“Por isso a opinião pública israelense está espantada: o holocausto perdeu seu poder como instrumento político. Nossa arma mais valiosa ficou cega.”
A rocha da existência de Israel apresentou trincas.
No topo da lista (do novo cenário provocado pela política israelense, a partir de Ehud Barak & Co – NR) está o fato que aparentemente ninguém percebeu até agora: a morte do Holocausto.
Diante do tumulto que este incidente provocou mundo afora, o holocausto não foi mencionado. Em Israel existiu, claro, aqueles que chamaram Recep Tayyib Erdogan de “novo Hitler”, e alguns que odeiam Israel falaram sobre “ataque nazista”, mas o holocausto praticamente desapareceu.
Há duas gerações que nossa política externa utiliza o holocausto como seu instrumento principal. A consciência pesada do mundo determina o comportamento frente a Israel. Os (justificados) sentimentos de culpa – para as atrocidades cometidas ou pela indiferença demonstrada – levaram os EUA e a Europa a tratar Israel de forma diferente do que outras nações, desde a militarização nuclear até os assentamentos. Todas as críticas contra as manobras de nossos governos foram estampadas automaticamente como anti-semitismo e levadas ao silêncio.
Dentre os milhões de mortos durante a Segunda Guerra Mundial, somente algumas mortes foram capazes de provocar um “sentimento de culpa”, principalmente em países ocupados e vítimas de uma das mais nefastas lavagens cerebrais de toda história humana. Como a verdade não pode ser abafada eternamente, resta a esses países adotarem práticas inquisitórias para impedir a pesquisa em torno deste dogma religioso – NR.
Mas os tempos estão mudando. Novas tragédias ensurdeceram os sentidos do mundo. Para as novas gerações, o holocausto está num passado distante, tornou-se um capítulo da história. O sentimento de culpa desapareceu em outros países, exceto na Alemanha.
Não são novas tragédias que ensurdecem os habitantes do planeta, mas sim a quebra do monopólio das informações. As mídias controladas apresentaram apenas uma versão dos fatos históricos – aquela dos vencedores. Com o aparecimento da mídia livre – a internet – o monopólio foi quebrado: o espírito saiu da garrafa, a humanidade está despertando – NR.
A opinião pública israelense não notou isto, pois a Shoa vive em Israel e está presente. Muitos israelenses são filhos e netos dos sobreviventes do holocausto, e o holocausto inseriu-se em suas infâncias. Além disso, um tremendo aparato evita que ele desapareça de nossas memórias: inicia-se no jardim da infância através de cerimônias e datas comemorativas, até viagens organizadas “para lá”.
Por isso a opinião pública israelense está espantada: o holocausto perdeu seu poder como instrumento político. Nossa arma mais valiosa ficou cega.
Uri Avnery
heise.de, 21/06/2010.
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